No ano de 2020 existiam em Portugal 2 345 267 pessoas com idade superior a 65 anos. Sabemos que nos pacientes acima dos 75 anos a vertigem é um dos sintomas mais frequentes que conduz à procura de ajuda médica. A vertigem está diretamente relacionada com o desequilíbrio e com o risco de quedas. Comparando o nosso país com a Suécia, que tem uma população equivalente, 10 milhões de habitantes, 48 000 cidadãos seniores, acima de 65 anos caem por ano e cerca de 1200 morrem. Estes dados correspondem a 4 mortes por dia por causas diretas ou indiretas das quedas.
As quedas nos idosos têm origem multifatorial; estados como anemia, má nutrição, doenças cardíacas e circulatórias (arritmias, hipertensão arterial…), diabetes, doenças neurológicas como a doença de Parkinson e demências, depressões, tratamentos farmacológicos múltiplos tão frequentes nestas idades, podem contribuir de forma decisiva. As estas causas associam-se com frequência um índice de massa corporal baixo, magreza, uma atividade física limitada e por vezes compromisso cognitivo. O compromisso vestibular (parte do ouvido interno responsável pelo equilíbrio) e multissensorial de controlo do equilíbrio não pode de todo ser esquecido na avaliação destes pacientes.
O equilíbrio depende da integração pelo sistema nervoso central (SNC) de informação proveniente da visão, vestíbulo e de recetores existentes nos pés, músculos, articulações… Com o envelhecimento ocorrem alterações degenerativas em todos estes domínios o que pode acarretar estratégias desadequadas de prevenção de quedas. Perante um buraco na calçada, um tapete enrugado, tropeçar num objeto, as respostas individuais para o mesmo nível de défice dependem acima de tudo da compensação pelo sistema nervoso central.
Com a idade, a visão deteriora-se e a capacidade de utilizar informação visual para melhorar o controlo do equilíbrio, especialmente aquando do movimento, também. A utilização de óculos bem-adaptados para corrigir défices visuais e a cirurgia de cataratas, quando necessário, são de especial importância.
A diminuição da sensibilidade táctil e vibratória que existe nas pernas e pés dos idosos, especialmente associada a neuropatias, como a que existe na diabetes, aumenta a instabilidade. Pode e deve ser trabalhada durante o treino do equilíbrio. A reserva muscular da qual dependem movimentos como o levantar da cadeira, a rotação do corpo, subir escadas, que exigem alternância do peso corporal só numa perna, está sempre comprometida nos seniores com atividade física limitada. Aumentar a força muscular é também um dos objetivos da reabilitação.
Em relação ao sistema vestibular, as estruturas também apresentam degeneração, logo a partir do nascimento, no caso das células ciliadas nos canais semicirculares, e a partir da meia idade nas máculas dos órgãos otolíticos e nos neurónios dos núcleos vestibulares. A este fenómeno chama-se presbivestibulopatia e está por detrás dos sintomas de vertigem e perturbação do equilíbrio experienciados pelos seniores. A assimetria e o défice de funcionamento vestibular condicionam as estratégias de equilíbrio que passam a ser desadequadas e ineficazes. Existe, por exemplo, comprovada ligação entre o lado da fratura do colo do fémur resultante da queda e o vestíbulo que funciona mal ou pior.
O papel da Vertigem Posicional Paroxística Benigna (VPPB) como causador de vertigem e desequilíbrio no idoso está muitas vezes subdiagnosticado e pode contribuir em até 33,3% dos casos. Assim, mesmo não havendo queixas claras de vertigem posicional as manobras de diagnóstico são obrigatórias na avaliação.
O papel da função vestibular no hipocampo (estrutura do SNC) está bem documentado. Assim, uma redução no funcionamento vestibular tem como consequência uma atrofia do hipocampo e compromisso do seu funcionamento. Este facto leva a desorientação espacial e compromisso da memória, tão importantes para o equilíbrio e com implicações no desenvolvimento de demências.
As experiências previas, as quedas ou quase quedas, com o receio e medo que acarretam e consequente comportamento de evitação associado, criam uma espiral descendente e limitações com consequências impactantes na qualidade de vida.
Do exposto se depreende que a avaliação do sénior com desequilíbrio exige uma abordagem multidisciplinar. O papel da Medicina Geral e Familiar, da Medicina Interna integrando as vertentes cardiológica, neurológica, psiquiátrica, metabólica, ortopédica, fisiátrica, é fundamental. Os doentes que chegam à consulta de Otoneurologia a pedir ajuda, quase sempre já percorreram este caminho.
A história e avaliação clínica são de suprema importância. A objetivação dos défices ou assimetrias vestibulares por Videonistagmografia, Video head impulse teste, a caracterização do desequilíbrio pela Vertical Subjetiva e Posturografia Dinâmica Computorizada, o passo seguinte. O objetivo final, a recuperação do equilíbrio. A capacidade de compensação pelo sistema nervoso central existe e o programa de reabilitação vestibular permite a adaptação do sistema, mesmo nos idosos. A estimulação optocinética, o treino em plataforma de posturografia dinâmica, os exercícios de estabilização do olhar, o treino do equilíbrio no domicílio, a tomada de consciência dos desvios posturais e sua correção, a intervenção no ambiente para o tornar mais seguro, o estímulo para adoção de comportamentos de vida ativa e sociabilização, fazem parte integrante do programa.
O progresso e desenvolvimento de uma Nação e de um Povo, também se mede pelos seus cidadãos seniores autónomos, com uma vida física, mental e social gratificante.